Ao ler estas palavras muitas vezes
deve ter pensado que não tenho coração.
Mas é por ter coração que as digo, é
por ter coração que cuspo a bile, o fígado,
Por ter coração que me revolto, indigno.
É por ter coração que me enciumo.
E esgarço até onde posso minhas peles,
revolvo-as, atiro-as contra a parede, contra você. Para que sinta o pútrido
cheiro que a mim extingue, e exala daqui.
E possa assim talvez, ou não, ou
nunca, ou pela derradeira agonia, nutrir meu
Sangue em fervura, caudaloso,
escaldante, e derramá-lo nestes pés de bolhas, marcas, vermes, doenças,
promessas, calçado pelas asas do demônio.
Raphael Vidigal
Pintura: Obra de Egon Schiele.
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