sexta-feira, 1 de dezembro de 2017

Feroz


E me sentir mais homem.
E me sentir mais cão.
Ao te cravar as unhas.
Ao me deitar no chão.
Ao me postar de quatro.
Ao te lamber as partes.
E me sentir entregue.
E possuir teus vãos.
Ao te enfartar em vida.
Ao te fartar do pão.
E saciar o bicho.
E saciar a fêmea.
E saciar o macho.
E saciar o cão.
Ao me sentir mais gente.
Com as veias aparentes.
E o ar a pleno pulmão.
Desfigurar teu ventre.
Abrir os interstícios.
Sentir como quem entra.
No dentro feito cão.
Com o osso pela boca.
E a baba em pelo ensopa.
O que é meu e nosso.
Pois já não tem sultão.
E te sentir inóspita.
E me sentir teu hóspede.
E oferecer a lança.
Que rasga à contramão.
E estar como quem caça.
O rabo feito a cobra.
O rabo feito o cão.
Comer o teu chocalho.
Sugar da pele o suco.
Conter do lábio o sal.
Extraviar teu barco.
Te debruçar no cálcio.
Puxar-te à embarcação.
E me sentir mais homem.
Deitado nu e casto.
Ao ver-te nua e casta.
Após a extrema unção.



Raphael Vidigal

Imagem: foto de Arthur Rimbaud. 

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