A vida é triste.
Mas o que podemos fazer?
Se não nos é permitido modelá-la.
Não nos foi dada a honra de fazê-la.
A vida em sua circunstância é um longo
arco,
Um arco que termina ao longe,
Do qual só nos é permitido enxergar a
ponta.
E por essa incapacidade do olhar,
Por essa insuficiência de horizonte
Sentimos algo a que se acostumou
chamar angústia.
A vida com suas dores acaba para quem
parte,
Mas não para quem embala o morto.
Por isto é sempre trágica, sob algum
aspecto.
Por isto é sempre cômica, sob outro
aspecto.
A vida do dia a dia não é muito diferente
dos dias venturosos.
Começa com uma longa puxada de fôlego,
E termina com a ausência que sucede o
êxtase.
Começa com uma esperança,
Com a expectativa do mistério,
E termina no momento em que
permanecemos nele.
A vida como uma migalha,
Como uma lupa,
Como um parêntese.
A vida como uma pomba.
Um olhar mais atrevido,
Ou um beliscão para constatar o sonho,
Não a desmancha.
Ela se desenrola e enrola de novo
feito carretel.
Puxamos o fôlego ainda na ausência que precede o êxtase.
Embora em ignorância.
Embora em melancolia.
E muito embora imperfeita
A vida é feita de pequenas misérias.
A morte é a reunião de todas elas.
Para que não se a desperdice,
Há os enlevos de Florbela Espanca
O ápice do Monte Everest
A sordidez do riso.
Raphael Vidigal
Pintura: "Quarto Azul", de Pablo Picasso.
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