Nunca dê
por morto
um bicho
que ainda vive
tenha ele
as esperanças
destroçadas
como a América Latina
ou o
crânio esmagado como um indígena
decepadas
as duas pernas e os braços
presos
numa árvore que balouça no inverno
rígido ou
ensopado numa poça de sangue
como um
reles mosquito com as asas ao
alcance
das patas de um urso tibetano faminto
os olhos
abertos porém indiferentes e vazios
a boca
branca de um mingau empapado
e as
narinas fechadas por tocos de algodões
embebidos
numa substância química
nunca dê
por morto um bicho que ainda vive
ao menor
relance no ínfimo da agulha que pinga
a gota
pela seringa os olhos espasmam a boca
baba os
braços desprendem as pernas tremulam
a farinha
do crânio se ajunta feito o rabo à lagartixa
e o
mosquito injeta no urso tibetano faminto o soro
da
esperança que destroçou o sonho da América Latina
Raphael Vidigal
Pintura: obra de Caravaggio.
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