terça-feira, 30 de agosto de 2011
Passarinho anarquista:
“A alma adora nadar. Para nadar, há que deitar-se de barriga. A alma despega-se e parte. Parte a nadar.” Henri Michaux
Passarinho que nada no mar
Quer morrer?
Quer morrer?
Passarinho que nada
N’água
Passarinho sem asa
Bico de nuvem salgada
Quer morrer?
Quer morrer?
A anarquia só pode existir se ela não existe.
Pintura: O pássaro inoperante, de Albert Pinkham Ryder.
Música: A Floresta do Amazonas, de Heitor Villa-Lobos.
Raphael Vidigal
segunda-feira, 29 de agosto de 2011
Prelúdio à Tarde de um Fauno:
“Espírito
é Vida
Ele flui por entre
a morte de mim
ininterruptamente
como um rio
sem medo
de tornar-se
o mar” Gregory Corso
carol coral sinto seus dedos
percorrerem meus lábios silenciarem qualquer sinônimo de indulgência
acolher de prata
a colher penteando pranteados cabelos
no salão cor de rosa
cheia de impertinência abdica
do que foi a vida
do que agora se chama morte
nada mais significa
sã acordes
sombra luz aporte
Debussy existe
Pintura: Boating on the Seine, de Renoir.
Raphael Vidigal
terça-feira, 16 de agosto de 2011
Realeza:
“Os homens apenas se podem salvar entre si mesmos. É por isso que Deus se disfarça de homem.” Elias Canetti
Não tinha tato para as causas da morte
Mantinha sonho para as coisas da vida
Nos compêndios do mundo
Há a morte
Há a vida
Nada que tenha sido morto
Incompreende a abstração real
Raphael Vidigal
Pintura: El Vendedora de Flores, de Diego Rivera.
domingo, 14 de agosto de 2011
Vida homem:
“Porque eu, meu amor, acho graça até mesmo em clichês” Adriana Calcanhotto e Antônio Cícero em Água Perrier
Essa vida livre não acolhe o homem
Cheio de suas regrinhas cacofonias
E no final uma grande desorganização geométrica
Quem inventou a aritmética arque com as consoantes
Nem só de vogais e sílabas vive o homem!
Nem só pó e si a viva poesia
Raphael Vidigal
Pintura: obra do escultor Amilcar de Castro.
terça-feira, 9 de agosto de 2011
Desconstrução anatômica:
“- Era belo, áspero, intratável.” Manuel Bandeira
Escolhi cada palavra escrever
Minha aspiração ser poeta
Mas pressa vida não se dá jeito
A não ser pela desconstrução anatômica
“As palavras são manchas desnecessárias sobre o silêncio e o nada.” Samuel Beckett
Pintura: leão deitado, de Rembrandt.
Raphael Vidigal
segunda-feira, 8 de agosto de 2011
Quintal:
sexta-feira, 5 de agosto de 2011
Encontro:
“Não há vontade para nós que somos
fragmento do assombro,
não tem saída para este retorno
para si mesmo, à pedra de si mesmo,
já não existem mais estrelas que o mar.” Pablo Neruda
Estou indo ao encontro da morte
A não ser que algo me pegue pelo caminho,
algo que não sei dizer,
algo bonito que não procuro
Chegarei a tempo
Esse frio me alarma
E me joga debaixo das cobertas
para escutar Beethoven
Ó que bela necessidade de encontrar o abrigo iluminado
Pela sonoridade abstrata de um rio, um lago
O gênio absoluto posto sob os conflitos
Mais sopráveis
Os quais apenas Deus controla
E só o pequeno homem esnoba
Meu incompleto propõe
Continuidade
Com a tranqüilidade, quem sabe
Do que irá morrer
Pintura: “Celebration”, de Lee Krasner.
Raphael Vidigal
quinta-feira, 4 de agosto de 2011
Ainda vou me... :
“Qualquer olho preenchido com a visão de mundo
não pode ver os atributos do outro mundo,
Qualquer olho preenchido com os atributos do outro mundo
ficaria privado da Beleza da Unidade.” Abdullah Ansari
Desde que você se foi
Que a idéia da morte
Desde que você se foi
Que a idéia da morte
Desde que você se foi
Que a idéia da morte
Desde que você se foi
Que a idéia da morte
Desde que você se foi
Que a idéia da morte
sossegue
Não há nada que eu faça que você não saiba
antecipadamente.
No campo magnético:
Mordendo para arrancar
Pedaços de carne
Que já não sabem mais ser boca
Ou simplesmente [beijó-miro] o amor
Um encantamento fugidio
E cáustico
No campo magnético
Do intocável
Raphael Vidigal
Pintura: “Portrait of the Infanta Margarita”, de Diego Velázquez.
quarta-feira, 3 de agosto de 2011
Artimanha:
“Os poetas não terminam os poemas, eles os abandonam” Paul Valéry
Na minha loucura auspiciosa
Estou me contornando
Admita a fraqueza de suas linhas, penas e curvas
Você não vale mais que intenções dolorosas
E se bastam
Dói demais
Essa maneira covarde
Como quem amamos
vai-seembora
Demorei a perceber a artimanha de Deus
Que manda uns
pra levar outros, embora
como velhos cavalos
estejamos todos sobreavisados
avisto a mola
a propulsão
Nessa eu não caio mais
Nessa eu fiz escola
Não há perdão para a vida
Cuja pregação é a morte
Pintura: A Chave, de Jackson Pollock.
P.S.: Será a morte fim ou continuidade?
Raphael Vidigal
terça-feira, 2 de agosto de 2011
Hermético:
“Eu não te darei carinho nem afeto
Mas pra te abrigar podes ocupar meu teto
Pra te alimentar, podes comer meu pão.” Lupicínio Rodrigues
A copa das árvores agasalha
Minha cabeça
E eu não gosto
Mas eu não posso fazer nada
Se o mel das abelhas me convém
E eu sou fácil
Qualquer um me lê
Qualquer um me vê
Eu sou fácil
Não há índios exterminados
Nem anjos descendo de estrelas coloridas
O suicídio ecoa em sinais distantes
São ecos cruzados, de um tempo sem consoante
Onde somente as vogais
Tinham voz tolerante
E há de me dizer hermético
Aquele que for ao mesmo
O brilho eco vazio de estrelas exterminadas
Na copa daquela árvore
Que nenhum cavalheiro assombra
E onde as abelhas
Já produzem mel
Para as mariposas fundamentais
Da história do ciclo geral
Do que se colocou chamar
Humanidade
Vale a pena que pena depende da tinta
E eu estou com vontade de coisas bonitas!
A copa das árvores
Me engole
E eu já não assumo só [Luiz melodia]
Raphael Vidigal
Imagem: Waly Salomão!
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